Encontras-me em ti

 

Todos os escritos são da autoria de Fernanda Cruz

Sinceramente

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“Sinceridade. Esta é uma das características que mais aprecio numa pessoa e é algo que eu admiro muito e quando acompanhado por espontaneidade e genuinidade, isso então já é uma pérola, algo muito difícil de encontrar. Independentemente da forma como acontece e da personalidade, a mim dá-me sempre conforto lidar com alguém assim.

Considero que nas conversas com pessoas sinceras, não há lugar para mal entendidos nem para assuntos proibidos. Tudo é permitido falar e tudo fica esclarecido de uma forma que no fim se sente que se saiu muito enriquecido dessas conversas e tudo toma o seu lugar. Eu ainda tenho a vantagem de distinguir essa sinceridade no imediato. Não preciso analisar, testar e pensar para depois então perceber se estão ou não a ser sinceros. Mas acho que todos conseguem, se quiserem.

Eu não me permitia ser assim. Escondia-me, não me revelava. Nestes casos o conteúdo da conversa é muito mais "oco" e dela saímos com as sensações de "se calhar não devia ter dito aquilo" ou "eu devia ter respondido" ou "o que é que ele/ela vai pensar". Pela minha experiência, o que pensamos ser protecção de nós mesmos é afinal medo do julgamento e dificuldade de acreditar/ confiar no outro. Pode ser também medo de se revelar oralmente aquilo que não queríamos aceitar sobre nós próprios e por isso muitas vezes estamo-nos a enganar. Pensamos que se não revelarmos algo que está cá dentro é como se esse algo não existisse para o mundo. O pior é que existe para nós e é a nós que fere em cada vez que optamos por não lidar com isso.

Já houve coisas que eu escondi e que me traziam sofrimento. Cada vez que surgia uma oportunidade e o assunto até se encaminhava para essa revelação, eu optava por não o fazer. Faz parte da minha nova postura ser o mais sincera possível com os outros porque é comigo que estou a ser. Ao fazer essas revelações já tenho ajudado pessoas que se calhar tem dentro delas o mesmo sofrimento e conseguimos dar uma ajuda a elas e a nós se o fizermos. Uma coisa é dar um conselho, outra coisa é falar pela própria experiência. A diferença da riqueza do conteúdo e do efeito é abismal. Há uma beleza, uma sintonia onde a gratidão e o perdão, mais do que pelo outro, por nós mesmos, se entrelaçam e curam feridas, muitas vezes as nossas e as dos outros.

Mas para se dar uma conversa destas é preciso estar de coração aberto, ter intenção de que só a verdade se manifeste, ser humilde no sentido de não permitir nunca que o outro se sinta inferior por fazê-lo pensar que tem um problema que nós nunca tivemos.

Ser sincero é ao mesmo tempo agir e falar de acordo com o que se sente e nada tem a ver com impulsividade, que está mais ligada à falta de auto-controlo, a atos irrefletidos que, consequentemente, podem levar ao arrependimento. Se compararmos o que sentimos depois de sermos impulsivos ou depois de sermos apenas sinceros, com certeza sentimos uma grande diferença. A tranquilidade da sinceridade distingue-se bem da ansiedade da impulsividade.

Sempre fui sincera mas a impulsividade falava mais alto e dava um tom agressivo ao que queria exprimir. Quando se começa a analisar o que se sente, facilmente se muda pequenas coisas no comportamento e quando se quer melhorar, é fundamental estar atento. Através disto, a paz que sinto em mim aumenta a cada instante e a amizade e o amor que sinto pelos outros e eles por mim, eleva-se a outro patamar, além de eliminar o fardo dos fantasmas e feridas que carregava. Não foi fácil conseguir ser assim mas estas recompensas são extraordinárias no efeito interior que causam. É uma bela forma de partilha, e enquadra-se totalmente na caridade que é o amor em ação. Uma conversa e postura assim, nunca me causou desconforto, nem novas feridas, pelo contrário, cicatriza tudo.

É claro que não tenho conversas destas com qualquer pessoa, mas se me disponibilizo a uma conversa a sério, tem de ser nestes moldes, ou nem a desenvolvo.

Eu não tenho medo de não ser coerente pois a minha "bitola", aquilo por onde me guio, é sempre o mesmo, é pelo que sinto. Por muito impacto que causem as minhas palavras, não posso deixar de as dizer pois não ficarei bem comigo se não o fizer, se evitar. Algum conhecimento de mim mesma vem da verdade e sinceridade exteriorizadas.

Não consigo encontrar nada de mal numa conversa sincera e ainda que influencie alguém com as minhas ideias e palavras, isto só acontece na medida em que esse alguém permitir ser influenciado.

Há uma evolução constante nos nossos caminhos mas cada coisa que passo a ver de outra forma não tira a veracidade de como entendia antes, apenas aprofunda. Quando eu aprofundo um assunto, isto só me traz vantagens. Ainda que a intenção seja clarificar para o outro, é também (e principalmente) para mim própria que o faço. Esta é a minha experiência.

Do patamar de sinceridade a que já cheguei, não posso mais descer, nem quero.”

 

Fernanda Cruz

 

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