Encontras-me em ti

 

Todos os escritos são da autoria de Fernanda Cruz

Faz aos outros o que gostavas que te fizessem...

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“É uma frase muito bonita esta. Aparentemente cheia de boas intenções. Tenho-a nas minhas citações favoritas. Acontece que estou a pensar seriamente em a retirar.

Já tive várias provas que não me posso seguir por ela para conseguir o meu ideal de conduta de vida e aquilo em que acredito. Por isso gosto cada vez mais do "depende". Um "depende" muda tudo. Dá-nos a certeza da incerteza, abre o leque.

Fazer aos outros o que gostava que me fizessem fecha esse leque à minha existência, aos meus gostos, aos meus sentimentos, aos meus pensamentos. Faz-nos ter, como alguém já disse, uma visão "palística" e considerar que todos reagiam como eu perante algo. Eu sei que o sentido que se dá à frase é o melhor possível, mas não me posso de todo reger por este princípio.

Por exemplo, quando estou mais perturbada, mais confusa ou mais deprimida, o melhor que me podem fazer é deixarem-me sozinha no meu canto e se me quiserem mesmo muito bem, o máximo que podem fazer por mim é emitir bons pensamentos ou uma prece que tenho a certeza que me chegará de imediato.

Por vezes, por ignorância, por seguir este pensamento, quando alguém que me é próximo, passava por um período semelhante, achava que o melhor era fazer precisamente isso, deixar a pessoa sossegada no seu canto e emitir bons pensamentos. E falhei... Tive situações em que as pessoas acharam que não queria saber delas nos piores momentos, que contavam comigo e não me mostrei disponível quando mais precisaram. Então depende...

O melhor então não é fazer aos outros o que gostava que me fizessem, vai muito, muito além disso. Exige muito mais do que isso. O melhor é conhecer o outro o máximo que eu puder, tentar entender, colocar-me sempre que possível no seu lugar e agir não como eu gostava que agissem comigo mas a como a pessoa gostava que agissem com ela.

Tem que se tratar cada pessoa como um universo. Entrar nesse universo e entendê-lo para se poder ajudar. Tal como diz o ditado "em Roma sê romano", se for para ajudar, não nos podemos impôr no universo da outra pessoa com as nossas verdades. Não podemos atuar na base do "se fosse comigo..." porque não é de mim que se trata. Trata-se de outro ser com outras experiências e outras vidas que o fazem ter uma visão única das coisas. Não é facil mas a vida é um aprendizado e quanto mais tentamos superar as dificuldades maiores os desafios que surgem.

Comparo com um jogo de computador. Quem não o joga, nunca se preocupou com a sua existência mas uma vez que se começa a jogar conhece-se cada vez melhor as regras e sente-se a necessidade de passar ao próximo nível, sabendo que será mais difícil que vai exigir mais tempo e dedicação, mais desafios. E em cada nível amealhamos o máximo de créditos possível porque não sabemos se vamos precisar deles no próximo. E o mais engraçado é que chegar ao fim não é o que nos traz o maior gozo, é mesmo jogar. Comparo só para que se entenda pois a existência não tem comparação possível e o que está em jogo é a evolução espiritual sabendo que o próximo nível pode só estar numa próxima vida.

Posso usar um exemplo mais simples. Quando quero dar um presente a alguém que me é muito querido é suficiciente pensar no que eu mais gostaria que me oferecessem a mim? Todos sabemos que não! Que quando temos mesmo gosto em oferecer aquele presente, temos de entrar na vida da pessoa e tentar adivinhar o que gostaria. Fácil de compreender mas difícil de por em prática pelo trabalho de casa por detrás do gesto.

Se me perguntassem qual o gesto mais bonito que poderiam ter para comigo eu responderia: na minha ausência, sorrirem ou sentirem conforto ao lembrarem-se de mim. Acho que isto é o melhor que se pode fazer a alguém e já é muita presunção querer chegar lá. Eu sinto isto com algumas pessoas, sinto felicidade e conforto por Deus me ter dado a possibilidade de saber que existem, ainda que com algumas não possa ter o contacto que gostaria.

Então devo fazer aos outros o que gostava que me fizessem? Depende...”

Fernanda Cruz

 

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